Será que é a barriga chapada ou o orgulho pelo meu corpo o que eu realmente quero?

Será que são os músculos, o corpo definido ou a liberdade de correr, rir e me despir sem a vergonha de não me encaixar?

Eu “simplesmente” acho mulheres magras mais bonitas ou eu que nunca conheci uma mulher gorda se amando quando eu era criança?

Será que eu sou mais bonita magra ou eu fui simplesmente doutrinada a apreciar ossos e abominar gordura?

Será que é mais saudável tomar lacto purga, forçar vômito, me machucar ou comer pão francês como todo mundo na mesa?

Será que era amor mesmo quando me diziam que eu não ia arranjar namorado se fosse gorda ou vergonha de ter que lidar com quem está fora do padrão?

Eu já não me odeio, eu uso o biquíni, eu estufo meu peito. Mas a menina que foi sempre zombada, rejeitada, moldada… ela ainda existe dentro de mim.

Eu falo pra ela todos os dias o quanto ela é especial, o quanto ela tem valor, o quão linda ela é por sorrir fácil, por querer um mundo mais justo, por conversar com qualquer um. Mas é difícil convencer essa garotinha.

Nunca ninguém, além de mim, incentivou seu amor próprio. Na vida da minha menina, eu sou a única que fala “não se preocupa com a sua barriga, você é muito mais do que isso”. Ela tem muita dificuldade de acreditar em mim.

Eu entendo. Eu acolho. Eu respeito. Talvez leve outros 30 anos pra ela, que mora aqui dentro de mim, acreditar no meu amor incondicional. E tudo bem.

Eu sou mulher, ela é menina. É meu papel mostrar que amor vai além dos olhos, que valor vai além do corpo, que beleza vai além da alma.

Aos poucos ela vai construindo a confiança em mim. Eu que por tantos anos julguei, xinguei, me separei daquela menina. Eu que por tantos anos me comparei, me escondi, me envergonhei.

Aos poucos eu vou recuperar a menina que se encolheu por não se encaixar, que parou de brilhar pra não incomodar, que aprendeu a calar pra nunca errar.

Ela pode levar o tempo que precisar. Eu nunca mais vou desistir dela, da minha essência, da mulher que sou.

Ela pode ser a criança porque eu já estou pronta pra ser a adulta que ela sempre precisou.